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Onde estará o cerrado de minha infância?

As veredas deste sertão goiano já não são mais o que eram em minha infância. Hoje há um mar interior de soja que devastou o ecossistema do cerrado, colocando-o em ameaça de extinção. Os buritis estão sendo derrubados e eliminados de suas veredas, junto com todas as árvores típicas do cerrado, aquelas que têm o tronco coberto por uma casca grossa, com folhas recobertas por um grosso verniz e com os troncos tortos O cerrado é um tipo de savana, isto é, suas árvores são bem espaçadas em relação com as outras. Por isto é que era fácil, para os bandeirantes, adentrar este tipo de sertão, como era fácil, em minha infância penetrar o cerrado em busca de frutinhas e aventuras.

Veredas em que vemos os belos buritis (uma espécie de palmeira típica do cerrado). Estrada que leva a Brasília, estado de Goiás (entre Catalão e Cristalina). 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

Veredas em que vemos os belos buritis (uma espécie de palmeira típica do cerrado). Estrada que leva a Brasília, estado de Goiás (entre Catalão e Cristalina). 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

Mata ciliar, beirando um córrego.Estrada que leva a Brasília, estado de Goiás (entre Catalão e Cristalina). 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

Os pastos das fazendas de gado substituíram o cerrado de modo predatório. Estrada que leva a Brasília, estado de Goiás (entre Catalão e Cristalina). 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

A onipresente soja, como um mar a se espalhar por quilômetros e quilômetros, devastou o cerrado.Estrada que leva a Brasília, estado de Goiás (entre Catalão e Cristalina). 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

O agronegócio é hoje uma atividade econômica com forte e avassaladora presença em Goiás. Até que ponto esta riqueza produzida pelo agronegócio chega ao cidadão comum, não posso saber. O que me chama atenção, viajando pelas estradas de Goiás, em direção a Brasília, vindo da Rodovia Anhanguera em São Paulo, é a ausência de casas e de pessoas, durante quilômetros e quilômetros seguidos. É impressionante o "vazio humano" destas terras interioranas goianas. Só vemos a presença humana através das onipresentes cercas de fazendas, das plantações (mecanizadas) e dos silos enormes para a estocagem de grãos. Sinto uma imensa solidão, ao viajar frequentemente para Brasília, como faço regularmente. Como venho de um estado muito populoso, São Paulo, onde moro, sempre me impressiono com apopulação rarefeita do interior goiano. Imaginem que esta população era muito mais rarefeita ainda na década de 1960. Isto quer dizer que a construção de Brasília deu um enorme impulso à interiorização do desenvolvimento e povoamento do Brasíl central (e esta era uma das intenções do presidente JK).

Loja de veículos agrícolas especializados em colheita. Cristalina, estado de Goiás. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

A prosperidade da soja é facilmente verificável nos carros como este, que circularm pela estrada. Cristalina, estado de Goiás. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

A agroindústria da soja, nestas imensas edificações de processamento dos grãos.Cristalina, estado de Goiás. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

O mar de soja pode trazer muitas riquezas para o estado de Goiás (especialmente para os detentores do agronegócio), mas, o que me chama a atenção é a devastação imensa que a lavoura da soja causou nesta área tão gigantesca. Em minha infância, nunca imaginei que o cerrado pudesse ser erradicado de amplas áreas geográficas no estado de Goiás (imenso estado, pouco povoado como era) como é hoje (a densidade populacional ainda continua baixa hoje em dia, mesmo que tenha aumentado nestes 50 anos de existência de Brasília). De certa forma, sinto sim um estranhamento ao ver esta paisagem tão rápida e profundamente modificada pela presença do homem (ou, no caso, das classes dominantes na agricultura brasileira), porque ainda me lembro da paisagem agreste do cerrado que via no final de minha adolescência, nos anos finais da década de 1970. A mim, naquele tempo, era inimaginável pensar que esta realidade de hoje fosse possível. O cerrado era tido como uma terra pouco adequada para a agricultura, por causa da pobreza e acidez do solo. Ao mesmo tempo, a vegetação do cerrado era considerada muito feia (ninguém admirava o cerrado). Portanto, se era raro alguém defender a preservação do cerrado, por outro lado, era também muito difícil encontrar quem pensasse que a agricultura, em larga escala, fosse possível num solo pobre em nutrientes e muito ácido, como era o solo do cerrado (a terra laterítica, pobre, carregada de óxidos de ferro milenarmente lavados pelas fortes chuvas do período primavera-verão).

O mar de soja. .Cristalina, estado de Goiás. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

Resquícios de cerrado. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

O agronegócio irrigado da soja. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

Cristalina era, desde minha infância, um grande centro de mineração de cristais e topázios. Hoje não vejo mais aqueles inúmeros vendedores de topázios (pedra semipreciosa) que apareciam na rodoviária de Cristalina nos oferecendo aquelas joias por um preço bem barato. Lembro-me que costumava comprar, dentro do ônibus mesmo, para dar de presente à minha mãe, minhas tias e para minhas irmãs e primas. Eram topázios de várias cores, lapidados como pingentes, bem bonitos, com correntinhas de prata. Não sei o que aconteceu com toda esta produção de pedras semipreciosas (será que ela se esgotou?, ou será que o grande capital tomou posse deste negócio também, afastando os pequenos vendedores?).

O cerrado não pode se transformar em mais um quadro pendurado na parede. Cristalina. 3 de Janeiro de 2010. Foto: Alberto Nasiasene

Alberto Nasiasene

Jaguariúna, 17 de janeiro de 2010

Rota Mogiana de Alberto Nasiasene é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Compartilhamento pela mesma licença 3.0 Brasil. Based on a work at www.rotamogiana.com.

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