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O novo século traz novas configurações democratizantes de comunicação


Carlos, quero falar algumas coisas com você, por escrito, a respeito de nossos projetos audiovisuais em comum. Já temos três documentários [o primeiro, o segundo e o terceiro] que irão ser ampliados, na medida em que a vida vai passando (este já era meu projeto, desde o início, quando o conheci na escola e você tinha 25 anos de idade e eu 51). Eu queria começar a aprofundar meu diálogo com os cientistas biológicos exatamente porque, naquele momento, tínhamos saído de uma eleição presidencial acirrada em que a direita neoliberal, com tinturas fascistizantes, na campanha Serra 2010, contava com o apoio dos supostos "pós modernos" ecológicos (tipo Gabeira) que nada tinham a acrescentar à agenda de transformação das estruturas sociais e econômicas profundamente desiguais, muito menos numa perspectiva socioambiental (defendiam a Amazônia intacta, quase nada falando contra o desmatamento da Mata Atlântica, para não ferir os interesses imobiliários de seus aliados neoliberais no centro sul, mas mantendo também intacta a crítica às estruturas socioeconômicas profundamente desiguais, surgidas desde o período colonial).

Havia um elemento novo naquele momento (mas só era novo para os ingênuos e jovens sem experiência cidadãs de lutas democráticas pela diminuição das desigualdades sociais), a deserção da Marina Silva do PT para aderir à proposta do Gabeira no PV (depois desta traição pessoal da herança do Chico Mendes, feita pela Marina, ex PT, que, num momento crucial da história brasileira, sob o risco de retrocesso brutal nas mãos do Serra PSDB, abandonou o barco dos setores democrático populares para subir ao palanque do Serra com o Gabeira coligado duplamente com a Mariana e os tucanos, no Rio de Janeiro). Esta era a segunda onda de traições e deserções de parcelas de militantes históricos do PT para compor com a direita golpista, desde 2005. Afinal, Heloísa Helena já havia trilhado este caminho nada nobre, aliando-se, vejam só, ao Arthur Virgílio, líder do PSDB no Senado, e Agripino Maia, líder do Dem (ex-PFL e Ex PDS e Arena) também no senado. Tanto a HH quanto a Marina, enquanto favoreciam os interesses demotucanos de retomar o controle dos rumos econômicos do país para o grande capital neoliberal, aliado ao mercado externo, em detrimento do mercado brasileiro e dos interesses nacionais populares, eram cortejadas fartamente pela grande imprensa (na verdade, pela oligarquia midiática do grande capital monopolizado por apenas cinco famílias, uma delas, a mais rica do país), mas isto não representava, de modo algum, uma adesão a teses de extrema esquerda, nem à agenda supostamente verde "autossustentável" (só para os ingênuos esta estratégia e esta tática podia enganar). O que intencionavam estes setores de direita, experientes nas lides políticas de grosso calibre, era enfraquecer o bloco não neoliberal, com apoio popular, capitaneado pelo PT (mas não controlado totalmente por este partido, afinal, era uma coalizão contraditória de forças políticas de centro esquerda, de esquerda e de centro direita, algumas com pendores anti neoliberais, outras nem tanto).

Portanto, esta linha de divisão maior, na batalha ideológica pela condução dos destinos do país nesta ou naquela direção, na democracia contraditória e imperfeita que temos, é claro que atingia todos os níveis da sociedade, até mesmo minha pequena escola de ensino fundamental. Ou seja, dentro da própria categoria dos professores, eu me sabia estar em minoria, já que a maioria dos professores não só dava ouvidos e credibilidade ao bloco opositor neoliberal, mas votaria nele também, em 2010, contra a Dilma (do mesmo modo que nunca votaram no PT, nem para presidente, em 2002). Para complicar mais o quadro, tínhamos também, dentro da rede municipal de ensino, nossos próprios problemas, na administração do Dr. Hélio PDT (coligado com o PT e muitos outros partidos). Não por acaso, evidentemente, como professor de história de centro esquerda (que teve uma formação marxista na juventude universitária e uma militância contra a ditadura militar, com muitos traumas e derrotas pessoais), eu estava em um período de intranquilidade e luta pela manutenção das conquistas já alcançadas e pelo avanço do aprofundamento das políticas públicas anti neoliberais de fortalecimento do Estado de Bem Estar Social (afinal, minha escola é uma escola que atende uma população favelada).

Foi neste momento histórico que você entrou em minha vida, aberto ao diálogo e à amizade, com a sua juventude e a inteligência generosa [quando foi substituir as aulas de ciências na escola, após a aposentadoria da professora que exercia a função]. Exatamente depois de uma experiência muito dolorosa que tive com um ex amigo e parceiro que quase leva minha vida (de ataque do coração). Você sabe o suficiente sobre este trauma que enfrentei e poderá perceber que me ajudou a superá-lo de forma bem saudável, construindo comigo uma parceria que espero que dure até o fim de minha vida. O impacto que você causou na minha família, foi profundo, afinal, minha filha hoje está fazendo engenharia agronômica na UFRRJ exatamente por causa da primeira excursão que fizemos à floresta e a São Luís do Paraitinga.

Mas não foi só uma influência pessoal altamente favorável que você causou em minha vida, foi também a realização de um desejo que eu tinha: o de aprofundar o diálogo com um cientista botânico a respeito da floresta. Diálogo que me faz crescer como ser humano e que me dá ânimo para prosseguir vivendo (a despeito de todas as reviravoltas políticas e todas as contradições da história nas quais estamos envolvidos). Preciso destes laços de amizade para sobreviver, mas, ao contrário do que pode parecer, não tenho muitos amigos na vida não. Na verdade, tenho pouquíssimos (mas tenho muitos colegas que não estão no nível da amizade, que, para mim, é algo mais profundo e menos superficial do que coleguismo de trabalho). Você é o único amigo cientista da natureza que tenho (e sua amizade já preenche minha necessidade existencial). Claro não estou dizendo que não tenho outros colegas, estou dizendo que você é um amigo com o qual posso sim continuar a produzir mais e mais documentários e materiais escritos diversos [sobre a temática socioambiental] até o resto de minha vida.

Nosso documentário no YouTube é o documentário [entre os dois canais que possuo] que tem a maior audiência e logo irá ultrapassar o mais antigo deles, o pequeno clipe de fotos que fiz sobre a obra de Vladimir Carvalho há alguns anos atrás [quando fui aluno do MIS Campinas] (já é a metade da audiência do primeiro que fiz e expus no YouTube [enviado para o YouTube há quase seis anos atrás]). Como você é jovem, poderá facilmente entender que a audiência no YouTube é inteiramente diferente da audiência da TV aberta, por exemplo. Não é uma audiência instantânea, em uma única hora ou em alguns minutos de medição pelos métodos antigos do Ibope. É uma audiência cumulativa que se estende no tempo (eu já havia analisado isto antes de me decidir por expor meus documentários abertamente por meio da internet [a exposição no YouTube é permanente e o conceito de tempo e audiência nesta mídia é inteiramente diferente das mídias convencionais]). Isto é, as pessoas vão assistindo estes vídeos, aos poucos, ao longo do tempo, quando querem, onde querem e do jeito que lhes aprouver [no computador, no tablet, no smartophone, na TV digitalizada etc.]. Claro, muito diferente de um filme em película que só tem audiência quando projetado em uma sala de cinema tradicional (mas, se você perceber, a audiência que já temos está bem dentro da média histórica recente de audiência de filmes documentários rodados em películas; excetuando-se os hollywoodianos e os best sellers nacionais [afinal, há salas de cinema de pouco mais de 200 lugares e muitos filmes documentários só são apresentados em festivais]). Para um assunto não muito atrativo para um amplo público, que gosta de ver muita pancadaria, comendo suas pipocas nos shoppings centers, até que podemos dizer que nosso filme está atingindo, por meio do YouTube, um público, cada vez mais, amplo (e irá continuar com sua trajetória cumulativa sempre ascendente). Além da audiência medida automaticamente pelo YouTube, não podemos averiguar a que se dá por meio de cópias baixadas livremente pelo YouTube (nem as que podemos fazer levando uma cópia que logo teremos em DVD para audiências diversas)[muitos constam como número individual de audiência, mas, na verdade, o que fizeram foi baixar o vídeo do YouTube para apresentar, por exemplo, em uma sala de aula, por meio de um data show ou uma TV LCD, através de um pendrive, e, por isto, a audiência do YouTube não revela completamente quantas pessoas viram o vídeo].

Eu já sabia disto e esta era a intenção original. O tempo irá divulgando seu trabalho [e o meu] para um público que se interessa pelo assunto no qual você é especialista e muitas portas futuras ainda irão se abrir para você exatamente por causa da divulgação deste documentário feito quando você ainda tinha 25 anos (de certo modo, como eu já lhe dizia, é um cartão de visitas de seu trabalho). Por comparação, os filmes documentários convencionais nunca tiveram um amplo público de assistência e estes filmes só começaram a ter maiores bilheterias no final do século passado (alcançando por volta de 50 000 ingressos vendidos, para mais ou para menos, em seus melhores resultados), com toda a repercussão do gênero e da divulgação que têm, como em festivais de cinema tais como o Festival de Paulínia, o de Brasília, o do Rio etc.. Mas é bom lembrar que Vladimir Carvalho e Eduardo Coutinho são clássicos do cine documentário brasileiro (conhecidos internacionalmente) enquanto que eu sou um "ilustre" desconhecido de qualquer público (além disso, nunca fui professor de cinema ou jornalista dos velhos tempos, nem trabalhei na TV). Portanto, na comparação, até podemos dizer que não estamos nada mal, por sermos desconhecidos.


Obrigado, meu amigo, por mais um documentário (o seu depoimento em minha casa, neste último dia 15). Outros documentários virão!

Até logo.

Alberto Nasiasene Jaguariúna, 21 de junho de 2014 PS. O endereço do site do Carlos está aqui.

Rota Mogiana de Alberto Nasiasene é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Compartilhamento pela mesma licença 3.0 Brasil.

Based on a work at www.rotamogiana.com.

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