top of page

A Mata Atlântica é aqui: A Mata de Santa Genebra em Campinas


Já me referi, em outra postagem, ao disparate pseudo ecológico produzido pela alienação pequeno burguesa no Brasil, quando indivíduos muito bem intencionados (os que costumam abraçar árvores em busca de "energias" vitais da natureza) defendem, retoricamente, a Amazônia (é claro, ela está lá longe e é bonito parecer estar na moda do "ecologicamente correto" mesmo sem saber direito o que vem a ser isto, muito menos com o compromisso de ser coerente com esta defesa em seu próprio quintal), mas nada fazem pela Mata Atlântica na qual e sobre a qual vivem (de maneira nada respeitosa e "ecologicamente correta").

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Aliás, o desconhecimento sobre a abrangência geográfica da própria Mata Atlântica é desproporcional face ao modismo verde que supostamente afeta parcelas ponderáveis da classe média que vive em seu território legal. Isto é, em Campinas, interior de São Paulo, a própria população sequer tem consciência de que vive em pleno território original da Mata Atlântica. Embora ainda restem, milagrosamente, resquícios da antiga Floresta Atlântica devastada, inicialmente, pela cultura da cana, depois, pela cultura do café e pela urbanização desenfreada, a maioria da população da região de Campinas sequer sabe distinguir o que é uma árvore brasileira (em geral) de uma árvore exótica (importada de outros biomas e outros continentes). Por exemplo, não sabem distinguir uma sibipiruna de um eucalipto (muito menos um flamboyant de um jequitibá) e, sem a menor consciência ecológica, diante do modismo "ecologicamente correto" de defender as árvores, em geral, vão plantando, aleatoriamente, o que quer que seja parecido com uma árvore, mesmo que a tal muda venha prejudicar o ambiente e o bioma original de Mata Atlântica (é o caso de um pinheiro especialmente danoso para o meio ambiente em que se encontra a Mata Atlântica, que se propaga destrutivamente como praga em territórios antes ocupados pela Mata Atlântica).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Já nem me surpreendo com a falta de visão ecológica de professores de ciências (formados em biologia) que não sabem que reflorestar não é a mesma coisa que plantar eucaliptos ou pinheiros (na verdade, este tipo de plantação é a mesma coisa que uma fazenda de café, uma plantação de eucaliptos e pinheiros, para fins comerciais ou não; não um reflorestamento). Talvez isto ocorra porque eles tenham sido formados em tempos em que não se enfatizava, nos cursos de biologia, as relações ecológicas sistêmicas entre os seres vivos de um determinado bioma (uns são especialistas em biologia celular, outros em zoologia indiferenciada, outros, em biologia teórica etc.). Portanto, fui percebendo que não é a formação específica em si mesma que irá garantir que um pesquisador, um intelectual ou um cidadão esteja comprometido realmente com a questão ambiental e ecológica (há diferenças entre o ambiental e o ecológico que não terei espaço aqui de destrinchar). Isto até é bom (não que ainda seja incompreensível que um biólogo qualquer, ou cientista de área correlata, não tenha que ter obrigatoriamente uma consciência e compromisso com os sistemas ecológicos em que vivemos) na medida em que torna a questão ecológica muito mais abrangente do que a delimitação restritiva de um corporativismo profissional específico (relativo às ciências biológicas).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

O que ainda me surpreende é que Campinas, uma das cidades mais ricas do estado mais rico do país, possua tão pouco de uma floresta que aqui era muito densa e vasta. Por mais que se fale, com razão, da importância daMata de Santa Genebra, ainda temos muito pouco de Mata Atlântica no município e poderíamos já ter uma área de preservação de Mata Atlântica muito mais vasta. A especulação imobiliária campineira, muito lucrativa, até incorporou agora, em seu marketing de vendas, o elemento ambiental, apresentando, ao consumidor embevecido, condomínios com "amplas áreas verdes" (mas pode ser que as tais "amplas áreas verdes" não passem de bosques de eucaliptos); mas isto é só para enganar trouxa, agregando um falso valor adicional ao imóvel pela suposta área verde mais ecológica que nada tem de ecológica (ao contrário, muitas vezes, é anti-ecológica, por afetar seriamente o meio ambiente do município, apesar do marketing).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Campinas, em seus começos, era conhecida como bairro das Campinas do Mato Grosso de Jundiaí, no século XVII e início do século XVIII. Interessante lembrar que o "Mato Grosso" que estava no apelido do bairro rural de Jundiaí, que hoje é o município de Campinas, era uma referência à densa floresta tropical (estacional semi decidual) que estava presente nos imensos horizontes de todo este território da Vila de Jundiaí, com algumas manchas de cerrado aqui e ali (por incrível que pareça, no meio do estado de São Paulo há a presença do bioma do cerrado também; mas o que predomina é a Mata Atlântica). Durante todos estes anos que venho pesquisando a história de Campinas, aprofundando-me, inclusive, nas suas questões ambientais mais remotas, comecei a suspeitar que os tais "campinhos" por onde foram alojados os primeiros pousos de tropeiros, no final do século XVII e início do século XVIII, na rota dos goiases, não eram manchas de cerrado, como eu supunha inicialmente, mas possíveis capoeiras deixadas pelos índios que eram os habitantes originários deste território antes da dominação portuguesa e antes das razias dos paulistas chamados de bandeirantes que penetravam o território tanto para fazer guerras de extermínio, quanto para prear índios como escravos (havia três campinhos que hoje estão perto das imediações do atual centro da cidade e, por outro lado, muitos indícios de que esta área não era de cerrado, mas de Mata Atlântica; portanto, como hipótese que precisa ser comprovada por meio de escavações arqueológicas, é possível que haja indícios enterrados no atual centro de que ali havia aldeias e roçados de índios).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Como também já afirmei em postagens anteriores, descobri, em 2011, um conceito muito importante que gosto de divulgar, o de restauração da floresta e o Pacto pela Restauração da Mata Atlântica com o qual, moral e intelectualmente, estou comprometido desde então. Se a Alemanha, um dos países mais industrializados do mundo, conseguiu restaurar as suas florestas em um terço de seu território, por que o Brasil não conseguirá cumprir a meta de restaurar 30% da Mata Atlântica? Hoje a floresta atlântica ocupa somente 7% de seu antigo território, mas ela pode avançar, a começar de Campinas, onde estamos, para restaurar a riqueza da floresta sobre a qual e com a qual vivemos.

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Qualidade de vida não é bosque de eucaliptos, ou de pinheiros, dentro de condomínios de luxo ou de classe média, mas ouvir, todas as manhãs, as araras, os papagaios, os periquitos, a maritacas e ver, de vez em quando, as capivaras saindo do rio Jaguari, como vejo em uma das cidadezinhas da região metropolitana de Campinas onde moro. Portanto, nada mais ecológico e dentro da moda do que lutar não só pela preservação do pequeno território de Mata Atlântica sobrevivente na Mata de Santa Genebra, administrado pela Prefeitura de Campinas, mas o de esperar que os atuais proprietários das terras circundantes tenham consciência de que deixar suas terras voltarem a ser ocupadas pela floresta atlântica é mais lucrativo do que o que eles obtém por meio das plantações (afinal, podem sim tornar aquela área circundante em RPPNs, ganhando incentivos fiscais e créditos de carbono; sem que os poderes públicos precisem desapropriar nada).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

O conceito mais importante que aprendi, desde que conheci o doutorando em botânica, pela Unicamp, Carlos Nunes, foi o de que a própria floresta consegue recuperar, espontaneamente, o território que está em suas imediações de modo que, com o passar do tempo, não é preciso fazer nada (quando há um núcleo vigoroso de Mata Atlântica por perto) para que a natureza vá fazendo o seu próprio trabalho de regeneração do entorno. Ora, isto tudo acontece, sem a interferência do homem, porque estas espécies vegetais levaram milhões de anos para desenvolver características próprias que as selecionaram adequadamente como sobreviventes em meio ao nosso clima e à nossa geografia (não por acaso, certas espécies da Mata Atlântica, como a embaúba, são tão resistentes, mesmo quando o homem tenta erradicá-las completamente implantando espécies exóticas que vieram de outros biomas).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Nossa floresta é muito mais bonita do que qualquer floresta de clima temperado e isto já era dito por homens (naturalistas desbravadores que acreditaram em nossas potencialidades antes mesmo que os colonos luso-brasileiros o pudessem perceber) como von Martius. Como eles eram homens de sua época e muito inteligentes, é claro, não deixaram de mandar nossas espécies, guardadas em latas, para a Europa, onde seriam cultivadas em jardins botânicos e serviriam de material de pesquisa para a indústria farmacêutica que iria surgir com força na segunda fase da Revolução Industrial a partir da segunda metade do século XIX (hoje, muitas destas multinacionais do ramo farmacêutico vendem remédios cujos princípios ativos foram descobertos em nossas plantas e muitos de nossa classe média alienada e com mentalidade colonizada ainda continuam achando mais bonito derrubar a Mata Atlântica e introduzir eucaliptos e pinheiros, imitando os estrangeiros).

Foto: Alberto Nasiasene. 2013

Por isto meso é que contribuo, sempre e tanto, com a quebra destes paradigmas de país dependente voltado para fora, até por meio da educação ambiental que pratico cotidianamente com meus alunos de escola pública e por meio da defesa ativa do pouco que restou de floresta atlântica na região em que moro. Sou daqueles que estão comprometidos com o Pacto de Restauração da Mata Atlântica a partir de meu próprio quintal (só quero espécies de Mata Atlântica em meu jardim, em meu quintal e em minha calçada).


Muito obrigado Lucas Magnin (biólogo da prefeitura de Campinas que trabalha com a Mata Santa Genebra), por sua generosidade em ter nos acolhido e explicado a mata para nosso grupo. Quero continuar a dar apoio ao seu trabalho.

Alberto Nasiasene

Jaguariúna, 17 de novembro de 2013

Rota Mogiana de Alberto Nasiasene é licenciado sob uma Licença Creative Commons Atribuição-Uso não-comercial-Compartilhamento pela mesma licença 3.0 Brasil.

Based on a work at www.rotamogiana.com.

Posts Em Destaque
Posts Recentes
Arquivo
Procurar por tags
Siga
  • Facebook Basic Square
  • Twitter Basic Square
  • Google+ Basic Square
bottom of page