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A Gente e a Pantasma da Gente


Aqui estão inseridos os slides da capa e da contra-capa do livro de poesias de um poeta, da geração de poetas marginais de Brasília, nos anos 1970 e início de 1980, o piauiense Climério Ferreira, que ganhei de Vladimir Carvalho no início de 1982. Ele foi aluno de Vladimir na UnB e escreveu estas poesias em homenagem à sua filmografia. Se vocês observarem bem, verão a figura de Vladimir, no desenho, impressa de várias maneiras, junto com as figuras populares de seus filmes (na capa e na contra-capa).

Dentro do livro, há belíssimas xilogravuras, feitas de forma artesanal mesmo, anexadas por entre as folhas de papel normal, onde estão impressas as poesias. As xilogravuras ilustram as poesias de uma maneira orgânica e são de autoria de Racsow; a capa e contra-capa são de Clodo; a montagem e arte final são de Wilton e a realização gráfica é de César.

Climério e Clodo são também autores de MPB. Eles compuseram várias músicas que foram gravadas por grandes intérpretes da MPB em minha adolescência e juventude (e eram conhecidos nos círculos intelectualizados de classe média universitária). No caso, as poesias, em formas de hai kais curtos, como se fazia na época, foram construídas para homenagear a filmografia de Vladimir Carvalho; especialmente os seguintes filmes: o país de São Saruê, incelência para um trem de ferro, a pedra da riqueza e quilombo.

O título do livro é uma brincadeira que o poeta climério fez com o episódio em que um dos personagens filmados no curta Quilombo, ao ver sua imagem sendo gravada pela câmera filmadora, falou que a pantasma da gente estava ali naquela máquina. Não sei porque ela usou tal expressão, mas suponho que seja por causa do arcaismo lingüístico muito comum em comunidades interioranas goianas. Ela pode ter usado uma expressão gráfica arcaica, pronunciando literalmente a grafia phantasma como se fosse a letra "p" mesmo. Ou seja, a pantasma da gente está aí na filmadora. Não sei exatamente porque isto aconteceu, nem encontro outra melhor explicação, mas me lembro bem que Vladimir costumava se referir a este episódio com muito carinho e admiração.

A reação daquele povo simples no interior de Goiás lembra muito a reação dos povos tribais, à volta do mundo, que nunca entraram em contato com a fotografia e cinema, porque muitos deles também costumam se referir a este fenômeno iconográfico, tão banalizado já entre nós, como se ocorresse algum aprisionamento do espírito, da alma, do mana ou seja lá o que, dentro da máquina fotográfica ou filmadora (eu gosto muito desta imagem-metáfora, e a tenho utilizado até mesmo em meus ensaios fotográficos de minha viagem peregrinação de 2006, porque, de algum modo misterioso, também acredito que a alma, de certa forma, fica sim aprisionada nas imagens; congeladas; para todo o sempre fixada naquele momento em que foi captada durante a tomada fotográfica ou cinematográfica e, como clérigo que sou, sou muito fascinado por este fenômeno).

As poesias do Climério estão impressas, neste livro, em cinco línguas: o português, o espanhol, o francês, o inglês e o alemão. É um livro curto, fininho, como se fazia na época da poesia marginal, mas de muito bom gosto (de certa forma, é uma obra coletiva). Eu o guardo como uma relíquia que ganhei de Vladimir Carvalho em 1982, junto com o outro livro, com os documentos gerados no encontro nacional de ABDs em Brasília; quando Vladimir Carvalho foi o presidente local da Associação Brasileira de Documentaristas seção DF (interessante que o presidente da Embrafilme, na época do encontro, era o atual ministro das relações exteriores, Celso Amorim; o presidente da Embrafilme foi uma das autoridades presentes neste encontro e há, impresso no livro que Vladimir me deu, o discurso dele sobre o cinema nacional na época, em diálogo com as demandas dos cineastas documentaristas e curtametragistas).

Por último incluo um slide com o documento de um protesto feito pelos cineastas presentes no encontro de 1981 em Brasília a respeito de uma brutal repressão feita a cineastas na Paraíba (nesta época é que eu estava na militância estudantil universitária e, por um detalhe documentado como este, é possível vocês pelo menos terem uma idéia geral de como é que era o clima no qual eu estava imerso). Apesar da política oficial de "abertura" do general Figueiredo, fatos como estes não eram incomuns não. Por isto é que este documento me ajuda a demonstrar que o que aconteceu comigo, em fevereiro de 1980, na Academia Brasileira de Letras, e ao final deste ano de 1982 e início de 1983, foram acontecimentos que não só me traumatizaram muito, mas destruíram sim minha vida estudantil universitária (e até hoje ainda sinto os efeitos de tais acontecimentos brutais em minha vida).


Alberto Nasiasene


Jaguariúna, 21 de fevereiro de 2008


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