Vladimir no Festival de Paulínia
Ao fazer estas tomadas fotográficas, no dia 13 de julho, não sabia que o filme de Vladimir Carvalho seria o vencedor na categoria de documentário, nem que o filme longa de ficção do dia, Febre do Rato, de Cláudio Assis, seria também o vencedor na categoria de longa de ficção. Portanto, as imagens captam momentos de expectativa que antecederam a premiação.
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Infelizmente, Vladimir Carvalho, veterano no cinema documentário brasileiro (e um clássico mundial ainda vivo no gênero) não possui recursos suficientes para investir em publicidade e divulgação (mas penso que a qualidade de um filme não está diretamente associada a quantidade de dinheiro existente para a publicidade). O cinema documentário de autor, no Brasil e no mundo, continua com uma dimensão artesanal que ainda imprime a ele uma qualidade estética próxima das artes plásticas muito mais do que da indústria do cinema (e eu sempre penso que isto é uma qualidade intrínseca que lhe dá credibilidade, não uma desvantagem), mesmo com todos os avanços existentes no reconhecimento de tal gênero, tanto pelo grande público, quanto pela mídia em geral. Por isto mesmo é que as vitrines representadas pelos festivais são importantes não só para a exibição dos filmes que Vladimir Carvalho faz, mas também para sua divulgação (e isto ocorre desde os primeiros filmes, a partir do Festival de Brasília, que é o mais antigo festival de cinema existente no país; idealizado por Paulo Emílio Salles Gomes) e isto é o mesmo em relação aos outros cineastas documentaristas. Mas, ao dizer isto, não pensem que sou contra o dinheiro e a publicidade no cinema. Ao contrário, sou a favor. O que afirmo é que não é a publicidade, em si mesma, que dá garantia de qualidade ao que quer que seja, muito menos no cinema. Há filmes com muita publicidade, tais como os blockbusters do cinema de Hollywood(com milhões de dólares para a publicidade em cada país e mais de 500 cópias dubladas ou legendadas para cada mercado específico), nem por isto se transformam em obras de arte que permanecerão importantes para a história do cinema na próxima década, por exemplo (mesmo que tenham dado um enorme retorno financeiro para seus produtores ou patrocinadores, como é comum na indústria do entretenimento, isto não os transforma em obras de valor artístico, mas apenas mercadorias utilitárias que logo esgotam seu valor de uso no mercado de entretenimento). Outros filmes são um fiasco total, em termos de bilheteria, mesmo com dispendiosa publicidade, o que só confirma o princípio de que não é a publicidade garantia nem de qualidade, nem de público.
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Gabriela Brasil, assistente de produção segura o cartaz do filme, com Vladimir Carvalho.
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Marcus Ligocki, produtor do filme. Foto: Alberto Nasiasene 2011
Por outro lado, não estou afirmando que uma obra de arte cinematográfica não seja também uma mercadoria produzida dentro do sistema sócio-econômico capitalista em que vivemos (não sou um romântico purista ingênuo nesta questão, mas um historiador com formação marxista e humanista prévias). Estou afirmando que ela é uma mercadoria em uma determinada dimensão social que não pode ser facilmente confundida pelo seu mero valor de uso. Isto acontece porque, em se tratando de mercado de arte (ou indústria de entretenimento), estamos lidando, direta e indiretamente, com a esfera do simbólico e o valor econômico aqui presente se revela como o capital simbólico de que tenho falado. Mas isto não deve ser entendido numa semântica exclusivamente subjetiva e esotérica não. É algo de bem palpável e mensurável. Por exemplo, é possível medir os valores financeiros empregados na produção de qualquer filme, além de ser possível analisar, economicamente (quantitativamente), todos os níveis de elaboração, produção e exibição de um projeto qualquer (tanto na quantidade de dinheiro empregada, no equipamento utilizado e no pessoal mobilizado e pago). Por isto mesmo é que é possível dizer que a produção de filmes tem um caráter industrial, mas devemos ser muito criteriosos quanto à conceituação desta dimensão industrial do cinema que estamos falando (especialmente no Brasil) para evitarmos confundir indústria, no sentido da segunda revolução industrial (como a que se instalou em Hollywood desde o início do século XX), com indústria no sentido da terceira revolução industrial que estamos vivendo desde o final do século passado (com equívocos correspondentes em relação aos sistemas de administração, tais como taylorismo, fordismo ou modernos sistemas pós-industriais cibernéticos baseados em domínio de conhecimentos técnico-científico e humanísticos). Além disso, em momento algum podemos nos esquecer que estamos diante de um processo sócio-econômico, cultural e político que gera produtos finais de natureza estética (por pior que seja o conteúdo e a forma do filme em questão) para serem usufruídos como mero entretenimento (nada contra o entretenimento e o lazer em si), ou como mais uma maneira de se conhecer (como na ciência) ou contemplar (como em certas obras de arte) o mundo e ser ou não desafiado, reflexivamente ou não, para os problemas ou temáticas apontados pelo autor do filme em questão.
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Quando dizemos que o cinema gera um produto que é também uma mercadoria, o filme, estamos apontando para sua materialidade (por mais abstrata que seja a temática do filme em questão), no caso, uma película de celuloide ou um suporte digital qualquer (DVD, CPU, Pen drive, cabos telefônicos, chips etc.). Por outro lado, quando afirmamos que este produto é usufruído por um determinado público (no mercado ou na sociedade), estamos também afirmando outro aspecto da materialidade deste produto, ele só pode ser usufruído basicamente pelos sentidos da visão e da audição (o cinema ainda não usa o tato e o olfato). Talvez seja por isto que este produto pareça ser, para o grande público em geral, algo mais esotérico e espiritualizante do que outro tipo de mercadoria que tenha uma materialidade mais palpável.
Foto: Alberto Nasiasene 2011
Gostaria muito de poder voltar a esta reflexão concreta a respeito da importância do desenvolvimento da atividade cinematográfica, como setor estratégico para a sociedade, na região onde moro, para poder explicar melhor a alegria que senti ao ver o filme de Vladimir Carvalho, Rock Brasília, ser premiado no Festival de Paulínia de 2011 como melhor longa documentário. No meu entender, é uma pena que o festival não tenha mais de um critério de premiação quanto ao gênero documentário (tais como o de melhor direção, melhor fotografia, melhor roteiro etc.), mas isto pode acontecer no futuro, na medida em que o festival for se desenvolvendo e consolidando como um dos pontos altos do cinema brasileiro. Entretanto, além de tudo, por ter tido a oportunidade que tive de estar junto a Vladimir, neste festival, sinto-me mais estimulado para me dedicar, ainda mais, à pesquisa da história do cinema na região (e em Brasília) e estreitar, ainda mais, meus laços de amizade e parceria com o Museu da Imagem e do Som (MIS) de Campinas (porque minha visão é a de um historiador que está envolvido na construção coletiva de uma reflexão crítica sobre a história do cinema brasileiro, a partir da sociedade civil, especialmente do cinema documentário; não a visão de um jornalista cultural, ou de um crítico ou acadêmico da estética do cinema que realizam suas atividades a partir da imprensa ou da universidade). Além disso, é claro, sinto-me ainda mais motivado para dedicar o resto de minha vida à pesquisa mais aprofundada sobre a obra de Vladimir e dos cineastas de Brasília e a continuar a dar a assessoria historiográfica e apoio cidadão à Fundação Cinememória que Vladimir está organizando em Brasília.
Alberto Nasiasene com Vladimir Carvalho, no restaurante. 13 de julho. Foto: Maria Ignez Feula Nasiasene 2011
O cinema tem várias dimensões. Uma delas é o seu próprio uso como material didático, por incrível que possa parecer à primeira vista (mas isto não é novo no Brasil não; ao contrário, é bem antigo, desde o INCE e à obra de Humberto Mauro que também me interessa muito pesquisar, como historiador). Isto é, estou afirmando que, hoje em dia, no início do século XXI, o cinema já é usado massivamente como material didático em salas de aulas, mesmo nas escolas públicas da periferia social Brasil afora, por meio de televisores e aparelhos de reprodução de DVDs (logo quase todas as escolas brasileiras estarão equipadas com os aparelhos de reprodução de Bluerays e televisores com telas de LCDs, além de datashows). Em minha escola (além de historiador, sou também um educador de história de adolescentes, no ensino regular, e de jovens e adultos, EJA, na rede municipal de ensino de Campinas), já utilizamos aparelhos de datashows através dos quais os filmes são projetados em tela grande, na parede, como nos antigos cineclubes estudantis (que utilizavam os projetores de 16 mm, como o que utilizei em minha antiga escola secundarista em Brasília). Isto acontece porque estamos em pleno transbordamento da chamada terceira revolução industrial e é indicativo de que o cinema brasileiro está ganhando também uma nova dimensão. em grande escala, que não tinha antes. Mas vou deixar a reflexão sobre este fenômeno para depois aqui e no blog Semeando História.
Alberto Nasiasene com Vladimir Carvalho perto do hotel Vitória ( hotel oficial do Festival). Foto: Maria Ignez Feula Nasiasene 2011
Alberto Nasiasene
22 de julho de 2011
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