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Fui procurar minha turma, e daí?


Obra de arte contemporânea exposta no SESC SP


Fazer arte contemporânea, é correr riscos. Expor, mais ainda. Portanto, já me acostumei a ser agredido (quando me elogiam é que fico surpreso). Vou mandar uns comentários de um cidadão que localizou um dos 250 vídeos que tenho exposto no YouTube e escreveu agressões gratuitamente a ele (não entendeu nada, porque estava esperando ver um documentário convencional sobre o campus da UnB, universidade onde meu pai trabalhou e onde brinquei minha infância). Eu estava, na verdade, ensinando a minha filha a filmar de forma livre e criativa, mas a partir de uma relação que mantemos com o mundo (documentando, de forma poética, nossa própria relação e valorizando nosso próprio ponto de vista subjetivo). Não tivemos nenhuma intenção de apresentar o campus da UnB para ninguém (era só uma brincadeira entre pai e filha, ao mesmo tempo que uma oficina de criação de vídeo arte).


Diante de um comentário (o único existente, na verdade, porque se eu tivesse a opção de escolher no YouTube, não iria deixar aberto a possibilidade de comentário algum), respondi da seguinte forma:

A obra é um ensaio poético de vídeo-arte e não tem a intenção de apresentar a UnB, didaticamente, para ninguém, mas de mostrar um relacionamento que o diretor tem com este espaço (onde cresceu, brincando como criança, onde seu pai trabalhava, na reitoria, e onde também estudou) e a música é feita por novos grupos que divulgam sua produção em Creative Commons. Portanto, nada mais normal que midiotas se sintam desnorteados com estes parâmetros (o vídeo foi feito para isto mesmo, para incomodar falsas percepções apressadas e pasteurizadas de quem tem horizontes estéticos limitados e lineares e mal sabe distinguir um vídeo documentário de uma vídeo arte). O inseto idiota que alguns veem talvez seja a projeção da consciência crítica de quem ofende por ofender, do alto de sua ignorância. Todo e qualquer inseto tem seu papel ecológico nesta micro ecologia universitária e era isto que estava sendo focalizado pelo olhar de uma estudante de agronomia que é filha do diretor do canal (o vídeo, na verdade, é um diálogo estético-existencial do diretor com sua filha e o namorado dela). A resposta que dou aqui é para um pirralho qualquer que escreveu asneiras e não merece que eu faça propaganda dele, por isto excluí o comentário ridículo dele daqui (vá procurar sua turma).

Obra de Marcel Duchamp


O tal "crítico de arte" fez sua réplica:



Realmente fiquei chocado com tanta falta de talento. Decidi ver o vídeo, porque estudei na UNB, não ví nada, só o idiota do inseto.

Respondi, em tréplica (só para me divertir um pouco com o comentário estético altamente especializado dele):


Você é que tem muita falta de talento analítico e sensibilidade artística até para assistir um vídeo descompromissado e despretensioso. Sua opinião não merece respeito e este vídeo não foi feito para pessoas como você. Foi feito para um outro público. O vídeo é um exercício livre de contato direto com o campus e a natureza que há nele, a partir de um ponto de vista existencial de quem foi criado brincando por ali, como eu. Insetos não são idiotas, mas parte de uma micro ecologia de um campus e era isto que estava sendo enfocado.

Ele deve ter ficado muito furioso comigo porque me respondeu assim:


Argumentos compatíveis com a inteligência esquerdista da maconha universitária. Conheci bem isso na UNB.

Diante de tamanha profundidade analítica, tive que responder de modo mais elegante:

Uma das obras expostas na Bienal de 2014. 31ª Bienal de Arte Contemporânea de São Paulo


Nunca fumei maconha (nem bebo, nem fumo). Portanto, antes de agredir, estude mais sobre arte contemporânea e vídeo arte.

Seu nível de argumentação analítica demonstra a sua imensa cultura sobre artes visuais contemporâneas no Brasil e no mundo (não estou ao seu altíssimo nível de exigência, mas não tenho complexo de inferioridade nenhuma, porque não fiz este vídeo pensando em pessoas como você e seu apurado gosto estético). Você não é obrigado a ver este tipo de vídeo (ou será que alguém o obrigou? neste caso, não fui eu).

Aliás, ninguém é obrigado. Este tipo de vídeo é feito para outro público. Por incrível que lhe possa parecer, há outro tipo de público que gosta destas coisas. Mas você não é obrigado a pensar igual. Claro.

Rotular, agredir e insultar, é fácil. É para qualquer um. Seja feliz com suas escolhas estéticas (nada contra, afinal, não perco meu tempo agredindo o padrão estético que você gosta; porque tenho mais o que fazer na vida). Pode ficar tranquilo, não fiz nada disto para lhe incomodar, mas para me expressar e me comunicar com outras pessoas que tem os gostos diferentes dos seus (e que gostam de ser provocadas para refletir questões estéticas).

Pavilhão permanente de exposição da Bienal de São Paulo


Fique tranquilo também porque sou abstêmio e não represento perigo algum para a sociedade (sou bem pacífico, por exemplo, nem fico insultando gratuitamente quem não gosta das mesmas coisas que eu gosto). Faz parte.

Obrigado por seu precioso tempo dispendido comigo. Não pretendo nada, nem quero incomodar o imenso público. O YouTube é só uma plataforma a mais, como outra qualquer. Estou quieto em meu canto e você pode ficar tranquilo, que não irei lhe agredir, nem verbalmente. É seu direito de gostar ou não gostar. Mas na arte, pelo menos desde os impressionistas, aprendemos a expressar o que temos para dizer ao mundo, gostem ou não gostem disto quem quer que seja; entretanto, sabemos que nem todo mundo vai sequer querer ver e você foi muito generoso porque pelo menos viu e teve paciência de chegar até o inseto.



Valeu!!! Obrigado.

Cliquei em uma opção para não mostrar o comentário de tal crítico estético de alto padrão. Afinal, não é meu interesse. Mas não sei se aparece para o grande público.

Ainda bem que ele não sabe onde moro e qual é meu endereço e não virá aqui em minha casa me agredir e a minha esposa.

Obra de Fábio Guimarães (artista de Salvador). Gosto muito da proposta estética dele, que mistura intencionalmente a construção fotográfica com a pictográfica de modo a despertar no público este estranhamento que faz refletir.



A maior parte do vídeo, na verdade, é a visão de minha filha (que estava aprendendo a filmar em diálogo com o pai), sem nenhuma regra dogmática que não queria lhe impor. Mas ela já tinha esta tendência de ser dissonante e ver coisas que eu não via, valorizando elementos da realidade, no ponto de vista subjetivo dela que só tinha vinte anos.

Eu não teria filmado a lagarta, mas não tem importância, o vídeo era uma parceria minha e dela (portanto, não cabe a mim censura alguma). É até interessante que uma menina não tenha tido repugnância de filmar uma lagarta como esta (mas é preciso saber que o olhar que filma é o olhar de uma estudante de agronomia que defende uma linha de pesquisa chamada de agro ecologia, bem diferente do agro negócio que usa agrotóxicos e talvez esta seja uma chave de entendimento da crítica gratuita que o vídeo foi alvo, o crítico pode ter se formado na agronomia da UnB que é íntima do agro negócio, enquanto que minha filha estuda na UFRRJ que tem um lado agro ecológico mais desenvolvido).

Entretanto, mesmo que eu não seja um jovem estudante de agronomia, aprendo muito com eles. Minha relação com minha filha me ajuda a não ficar tão careta diante dos jovens de hoje (mas eu não fumo nada, nem maconha, nem cigarro). Aprendi a não rotular, nem rejeitar a priori. Talvez seja por isto que as portas da juventude criativa do Rio de Janeiro e do movimento estudantil estejam abertas para mim.

Antes que me esqueça de dizer, minha filha está amadurecendo e depurando seu olhar estético (mas ainda não aprendeu direito como fazer a montagem dos filmes que faz). Uma coisa de cada vez, no ritmo de cada um. O importante é não ter medo e prosseguir em frente.

O que incomoda, para além de tudo, é o olhar feminino de uma jovem inquieta que focaliza elementos de um espaço geográfico em que foi levada para ver, desde pequenina (a reitoria da UnB era o local onde meu pai, o avô dela, trabalhava e ela foi lá muitas vezes, levada pelo pai, por isto o olhar de encantamento dela com coisas que muitos não dão importância).

Obra de Duchamp


Eu falei de direção, como se fosse eu quem estava dirigindo (talvez sim, de modo livre, indiretamente), mas dei a direção deste vídeo para minha filha aprender a fazer o que queria, sem reprimi-la (de modo que ela filmou do jeito que queria, sem preocupação alguma). Depois é que eu fiz a montagem e acrescentei inúmeros efeitos às imagens que foram feitas por meio de uma filmadora Sony. Assumi a defesa do vídeo, não só porque ela é minha filha, mas porque foi uma parceria minha com ela. Dei a câmera e a direção para ela (porque era um exercício de direção de filmagem). Fiz algumas tomadas, quando filmo ela, o resto é dela (a montagem é minha, em diálogo com a linguagem cinematográfica e com Eisenstein; mostrando a ela, sempre reclamando, como é do estilo dela). Hoje ela, que também era bem petulante, neste momento em que faz as tomadas filmográficas do campus (como filha, ela pensava que tinha o direito de me criticar porque não usava os referenciais estéticos que ela tinha interiorizado sem refletir suficientemente neles e talvez estes referenciais convencionais não fossem tão diferentes do tal crítico que escreveu no comentário do YouTube, diferindo apenas na direção, que, nela, estava mais para a esquerda, quanto a conteúdos). Entretanto, eu estava tentando ensinar, nadando contra a vontade imperiosa dela (que é do signo de escorpião), que ninguém nasce sabendo dominar a linguagem estética do audiovisual e que era preciso sentar, junto ao pai, para aprender a montar (ela, criada no mundo digital, pensava que já sabia de tudo, como qualquer adolescente no Raul Pila e não tinha tempo, na agenda dela, para reservar um espaço para o pai que queria ensinar a fazer a montagem). Pelo menos posso dizer que ela já está no ponto de dirigir sozinha, sem a minha presença, e que já está querendo se sentar ao meu lado voluntariamente para aprender comigo como fazer a montagem ao modo dela.

Aqui, neste making off, na casa do meu amigo Carlos Nunes, em Barão Geraldo, pouco tempo depois do vídeo do campus, ela ainda retruca ao pai (pensando que não precisava aprender nada), mas o pai ainda continua a empregar o processo pedagógico dialógico e crítico de um Paulo Freire e Augusto Boal (sem que ela percebesse). É um estágio a mais na pedagogia da imagem que ela estava tendo, sem perceber (ela sempre vivia me chantageando emocionalmente, dizendo que eu não dava atenção suficiente a ela, só a Vladimir Carvalho, por exemplo). O próprio processo é filmado, na medida em que ele vai acontecendo (como em Jean Rouch).


Neste caso, em específico, radicalizei ainda mais, porque ela estava muito petulante comigo me exigindo a aceitar certos convencionalismos que eu já havia decidido, desde que fui aluno do curso da Pedagogia da Imagem, no MIS, em 2007, a rejeitar. Isto é, uso, de propósito, a textura de filme muito antigo, estragado, parecido com os filmes mudos dos anos 1920 e 1930 (da época do Eisenstein), só para mostrar para ela que o pai sabia o que estava fazendo.




Alberto Nasiasene


8 de outubro de 2016


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